Cross-Linking em ceratocone: riscos e complicações

Riscos e complicações do cross-linking em ceratocone.

O ceratocone geralmente se manifesta entre na infância e adolescência. Não há predileção por sexo e a doença está associada ao hábito de esfregar ou coçar os olhos vigorosamente. Alergias oculares, atopias e o hábito de coçar os olhos são considerados fatores predisponentes. Apesar de numerosos estudos, o processo bioquímico subjacente e a etiologia precisa do ceratocone não são bem compreendidos. A doença pode apresentar progressão, provocar piora da visão e prejudicar a qualidade de vida dos portadores.

A orientação mais importante a ser dada ao paciente com ceratocone é interromper o hábito de coçar, esfregar ou apertar os olhos. A correção visual se faz com óculos ou lentes de contato e em casos raros pode ser necessário transplante de córnea. Entre outras opções de tratamento que são oferecidas por alguns oftalmologistas, mas não são adotadas pela maioria dos profissionais, estão a cirurgia de colocação de anéis intra-corneanos e o cross-linking de córnea.

O tratamento com cross-linking de colágeno (CXL) foi introduzido há pouco mais de 10 anos, em 2003. A técnica pode variar, assim como os equipamentos usados, mas geralmente remove-se o epitélio da área central da córnea, trata-se a superfície com uma solução de riboflavina 0,1%  e  irradia-se a córnea com UVA de 370 nm de comprimento de onda, durante 30 minutos.

Existem diversos riscos e complicações relacionadas ao cross-linking de córnea. Um dos riscos do CXL é o tratamento ser ineficaz ou mesmo agravar a doença. O ceratocone é uma doença que geralmente apresenta progressão lenta e imprevisível. A maioria dos pacientes com ceratocone inicial detectado através do exame de topografia de córnea não apresenta progressão da doença. Um estudo baseado na análise de 117 olhos de 99 pacientes documentou uma taxa de insucesso de 7,6% e uma piora da acuidade visual em 2,9% dos olhos operados.

Os trabalhos publicados apresentam falhas metodológicas importantes, além de potenciais conflitos de interesse financeiros, comerciais e intelectuais. É possível que a incidência de complicações seja maior do que está indicado na literatura oftalmológica.

Uma revisão sobre as complicações decorrentes do CXL publicadas na literatura (Dhawan e col., 2011) apresenta as principais complicações precoces e tardias do procedimento CXL. Em alguns casos pode ser necessário transplante de córnea e pode ocorrer dificuldades na adaptação de lentes de contato:

  • úlceras infecciosas da córnea – manifesta-se nos primeiros dias
  • Opacidades na córnea (corneal haze) – esta complicação pode ocorrer em 9% dos olhos operados e perdurar mais de 1 ano
  • Lesão do endotélio da córnea provocada pela radiação UVA
  • Inflitrados corneanos periféricos
  • Reativacão de herpes ocular
  • Erosão recorrente da córnea.

O ceratocone inicial é apresentado como a principal indicação do CXL. O ceratocone inicial apresenta evolução imprevisível;  não há na literatura trabalhos de acompanhamento a longo prazo para confirmar a segurança, indicações e contraindicações para o CXL; nenhum dos trabalhos comparou os resultados do CXL com a simples orientação de não coçar ou esfregar os olhos; já foram descritos diversas complicações relacionadas ao procedimento.

Nossa opinião é que, antes de pensar em se submeter a um procedimento cirúrgico invasivo e que apresenta riscos de complicações, todo paciente deve ser orientado a não coçar, não esfregar, não apertar os olhos. Em nossa opinião a eficácia dessa orientação é superior à eficácia do CXL. Estudos de longo prazo mostram que aproximadamente 25% dos pacientes submetidos ao cross linking apresentam evolução da doença e não existem estudos que comparam o resultado do CXL com a interrupção da agressão decorrente do hábito de coçar os olhos.

* Diferentes médicos, diante do mesmo paciente, frequentemente diferem quanto ao diagnóstico e/ou quanto ao tratamento indicado. Yehuda Waisberg, autor desse texto, é médico oftalmologista com vasta experiência no atendimento e adaptação de lentes de contato em pacientes com ceratocone. Ao aconselhar seus pacientes, adota postura conservadora, priorizando opções de tratamento pouco invasivos, de menor risco e menor custo para o paciente.

1) Evripidis, S; Rushmia, K; Jennifer R, E; Catey, B; Kwesi N, A-A; Showrob, P; Peter J, M; Samer, H Corneal Collagen Cross-linking for treating keratoconus. The Cochrane Library, Issue 4, 2015, Art. No. CD010621. DOI: 10.1002/14651858.CD010621.pub3; 2) Dhawan, S; Rao, K; Natrajan, S. Complications of corneal collagen cross-linking (Review Article)  Journal of Ophthalmology 2011, Artcle ID 869015, 5 pages, dpi:10.1155/2011/869015; 3) Seler, TG; Schmidinger, G.; Fischinger, I; Seller , T   Komplikationen der Vernetzung der Hornhaut  Ophthalmologe 2013 110.639-644 DOI 10.1007/s00347-012-2682-0; 4) Meek, KM; Hayes, S. Corneal cross-linking – a review Ophthalmic & Physiological Optics 2013, 33: 78-93

Cross-Linking em ceratocone : é prudente aguardar

Cross-linking em ceratocone

Há poucos dias foi publicada uma revisão referente às evidências sobre a eficácia do cross-linking (CXL) com riboflavina e radiação ultravioleta (UVA) para reduzir ou interromper a progressão do ceratocone em seus estágios iniciais. Esta revisão faz parte das revisões sistemáticas promovidas pela base de dados Cochrane (Cochrane Database of Systematic Reviews, Issue 4, 2015).

O ceratocone geralmente se manifesta entre 10 e 20 anos de idade. Não há predileção por sexo e a doença está associada ao hábito de esfregar ou coçar os olhos vigorosamente. Alergias oculares, atopias e o hábito de coçar os olhos são considerados fatores predisponentes. Apesar de numerosos estudos, o processo bioquímico subjacente e a etiologia precisa do ceratocone não são bem compreendidos. A doença pode apresentar progressão, provocar piora da visão e prejudicar a qualidade de vida dos portadores.

A orientação mais importante a ser dada ao paciente com ceratocone é interromper o hábito de coçar, esfregar ou apertar os olhos. A correção visual se faz com óculos ou lentes de contato e em casos raros pode ser necessário transplante de córnea. Entre outras opções de tratamento que são oferecidas por alguns oftalmologistas, mas não são adotadas pela maioria dos profissionais, estão a cirurgia de colocação de anéis intra-corneanos e o cross-linking de córnea.

O tratamento com cross-linking de colágeno (CXL) foi introduzido há pouco mais de 10 anos, em 2003. A técnica pode variar, assim como os equipamentos usados, mas geralmente remove-se o epitélio da área central da córnea, trata-se a superfície com uma solução de riboflavina 0,1%  e  irradia-se a córnea com UVA de 370 nm de comprimento de onda, durante 30 minutos.

A ideia na qual se fundamenta este tratamento é que ele seria capaz de aumentar a rigidez  e aumentar a estabilidade da córnea. Este é o único tratamento que alega interromper a progressão do ceratocone. ENTRETANTO, é um tratamento recente, que foi introduzido sem que tivessem sido realizados estudos bem planejados para verificar qual o paciente ideal que poderia se beneficiar do tratamento, indicações e contraindicações, assim como sua segurança e eficácia a longo prazo.

A revisão Cochrane sobre cross-linking no ceratocone, incluiu a análise de 482 referências; 431 destas referências foram descartadas como sendo pouco relevantes aos objetivos da revisão. Foram incluídos estudos conduzidos na Austrália, Reino Unido e Estados Unidos, nos quais foram analisados um total de 219 olhos.

O tratamento pode estar associado a diversas complicações como edema difuso da córnea, opacidades no estroma, infiltrados para-centrais, vascularização periférica da córnea, erosão recorrente da córnea, ceratite infecciosa, falência endotelial, uveíte. Em outro texto apresentaremos as principais complicações relatadas em olhos submetidos ao CXL para o ceratocone.

A conclusão dos autores da revisão é que não existem evidências de que o cross-linking da córnea (CXL) seja, de fato, um tratamento eficaz para interromper a progressão do ceratocone.

Há necessidade de estudos de melhor qualidade, antes que se possa realizar uma avaliação adequada para confirmar a importância desta modalidade de tratamento.

Referência:

Evripidis, S; Rushmia, K; Jennifer R, E; Catey, B; Kwesi N, A-A; Showrob, P; Peter J, M; Samer, H Corneal Collagen Cross-linking for treating keratoconus. The Cochrane Library, Issue 4, 2015, Art. No. CD010621. DOI: 10.1002/14651858.CD010621.pub3