Lei de Cotas e Visão Monocular

Leis, decretos e normas federais, estaduais e municipais buscam promover melhor inserção do deficiente físico no mercado de trabalho, seja no serviço público ou na iniciativa privada.

Neste sentido, a Lei nº 3.298/99 art. 37 reserva para deficientes físicos cota de 5% das vagas em concursos públicos e a Lei nº 8.213/91 art. 93 obriga empresas com mais de 100 funcionários a preencher de 2 a 5% dos cargos com beneficiários reabilitados ou pessoas portadoras de deficiência física, a chamada Lei de Cotas.

A deficiência visual é uma das formas de deficiência física. Desta forma, deficientes visuais estão qualificados a usufruir os benefícios da Lei de Cotas.

Em 1973, a Organização Mundial de Saúde, buscando a padronização da definição de deficiente visual em âmbito internacional, definiu cegueira como visão inferior a 0,05 no melhor olho ou campo visual igual ou inferior a 10º no melhor olho. Esta definição de cegueira legal ou deficiente visual foi adotada no Brasil e  é utilizada em artigos científicos e estatísticas públicas sobre cegueira.

Pessoas que apresentam redução da visão nos dois olhos, mas que não se enquadram na definição de cegueira legal, são considerados portadores de visão subnormal. Pessoas cegas de apenas um olho são consideradas portadoras de visão monocular.

Portadores de visão monocular não eram considerados portadores de cegueira legal e não eram considerados deficientes visuais para  acesso os benefícios de leis dirigidas a deficientes físicos, como a lei de cotas.

Em 2009, foi emitida da Súmula nº 377 do STJ, com o  enunciado: “O portador de visão monocular tem direito de concorrer, em concurso público, às vagas reservadas aos deficientes”.

Pouco depois a AGU publicou a Súmula nº 45/AGU: “Os benefícios inerentes à Política Nacional para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência devem ser estendidos ao portador de visão monocular, que possui direito de concorrer, em concurso público, à vaga reservada aos deficientes”.

O Parecer/Conjur/MTE/nº 444/2011, do Ministério do Trabalho, manifesta o entendimento de que “os portadores de visão monocular devem ser considerados deficientes para fins de preenchimento da cota prevista no art. 93 da Lei 8.213/91, independentemente da existência de lei estadual neste sentido”.

Atualmente no Brasil, portadores de visão monocular são considerados deficientes visuais para fins de preenchimento de cotas reservadas a deficientes físicos,  no serviço público e na iniciativa privada.

Cegueira, Visão Subnormal, Deficiência visual e Deficiente visual

Neste texto apresenta-se o significado das palavras cegueira, visão subnormal, deficiência visual e deficiente visual, no sentido médico e jurídico.

Cegueira e cegueira legal

Entende-se por cegueira, tanto a perda total da visão quanto a perda parcial, segundo critérios bem definidos. Oftalmologistas evitam utilizar a palavra cegueira frente a pacientes e suas famílias, exceto nos casos de cegueira total. Na maioria das vezes, utiliza-se palavras como deficiência visual leve, moderada ou severa.

Em 1973, a Organização Mundial da Saúde (OMS) publicou o relatório técnico nº 518 sobre Prevenção da Cegueira, no qual propôs a padronização da definição de deficiência visual e cegueira em âmbito mundial, com o objetivo de facilitar a compilação de dados estatísticos internacionais. Sugeriu que todos os Países adotassem a definição proposta e recomendou que Países que adotassem outras definições deveriam ajustar suas estatísticas à prática internacional.

Cegueira passou a ser definida como deficiência visual severa em ambos os olhos. O Brasil adotou a definição proposta pela OMS em suas leis dirigidas a facilitar a inserção de deficientes visuais na sociedade, em serviços de reabilitação e no mercado de trabalho, além de oferecer outros benefícios sociais como isenção de impostos e aposentadorias especiais. O portador de cegueira em ambos os olhos é classificado como deficiente físico por deficiência visual.

Segundo a definição adotada internacionalmente, apenas pessoas portadoras de cegueira nos dois olhos são considerados deficientes visuais. A cegueira em apenas um olho, a chamada visão monocular, não se enquadra no conceito de cegueira. Portadores de deficiência visual moderada ou severa em um dos olhos, não se consideram cegos e ficariam indignados, discriminados e mesmo agredidos moralmente se “classificados” como cegos.

O Brasil e outros países possuem legislação específica, com o objetivo de facilitar a inserção de deficientes visuais na sociedade, em serviços de reabilitação e no mercado de trabalho, além de obter outros benefícios sociais como isenção de impostos, aposentadorias especiais etc.

Neste sentido houve necessidade de definir parâmetros para classificar quais portadores de deficiência visual bilateral severa poderiam se habilitar aos benefícios da Lei. A portaria nº 3.128/2008, em seu art. 1º define quem pode ser classificado como deficiente visual:

Art. 1º

  • 1º Considera-se pessoa com deficiência visual aquela que apresenta baixa visão ou cegueira.
  • 2º Considera-se baixa visão ou visão subnormal, quando o valor da acuidade visual corrigida no melhor olho é menor do que 0,3 e maior ou igual a 0,05 ou seu campo visual é menor do que 20º no melhor olho, com a melhor correção óptica (categorias 1 e 2 de graus de comprometimento visual do CID 10) e considera-se cegueira quando estes valores encontram-se abaixo de 0,05 ou o campo visual menor do que 10º (categorias 3,4 e 5 do CID 10).

No entendimento médico,  “melhor olho” é entendido como aquele que tem melhor função, melhor visão considerando-se os dois olhos de cada pessoa. Se determinada pessoa perdeu um dos olhos, o olho remanescente é “seu melhor olho”; se perdeu total ou parcialmente a visão de um dos olhos, o olho que se mantém com boa visão é “seu melhor olho”; se os dois olhos apresentam baixa visão, aquele que apresenta visão menos prejudicada é “seu melhor olho”.

Utiliza-se o termo cegueira legal para indicar os portadores de deficiência visual severa (categorias 3, 4 e 5 do CID 10) nos termos do § 2º do art.1º da portaria 3.128/2008: considera-se cegueira quando valor da acuidade visual corrigida no melhor olho encontra-se abaixo de 0,05 ou o campo visual menor do que 10º . Este conceito de cegueira legal é utilizado em estatísticas oficiais sobre registro de pessoas cegas e também em trabalhos científicos na literatura oftalmológica.

Visão subnormal

O termo visão subnormal é utilizado para descrever pessoas com deficiência visual leve ou moderada nos dois olhos: Considera-se visão subnormal, quando a acuidade visual corrigida no melhor olho é menor do que 0,3 e maior ou igual a 0,05 ou seu campo visual é menor do que 20º no melhor olho, com a melhor correção óptica (categorias 1 e 2 de comprometimento visual do CID 10).

Deficiência visual

A palavra deficiência visual refere-se à condição de qualquer pessoa que apresente cegueira ou visão subnormal, mas também à deficiência de visão cromática, estrabismo, diplopia e outras condições. O termo visão monocular é utilizado para portadores cegueira legal em um dos olhos com visão normal no outro (CID H54.4). Estes deficientes visuais não se enquadram na definição de cegueira legal definido na portaria 3.128/2008.

O ser humano adapta-se bem à perda da visão de um dos olhos. Mantém-se visão de profundidade adequada para a maioria das atividades da vida diária, inclusive direção de veículos automotores. A legislação para obtenção de carteira nacional de habilitação permite que indivíduos com visão monocular obtenham CNH categorias A e B. A visão normal em apenas um olho é adequada para locomoção, leitura, estudo, competição em ambiente de trabalho. A perda da capacidade laboral não está presente nos casos da pessoa monocular, para a maioria das profissões. Qualquer deficiência visual implica em dificuldades e incômodos às pessoas acometidas. Entretanto, apenas os portadores de deficiência visual bilateral severa podem ser enquadrados na definição de cegueira legal, passando a usufruir de benefícios sociais previstos na legislação pertinente.

Deficiente visual

Deficiente visual é qualquer pessoa com cegueira legal, para fins de registro em estatísticas de saúde pública eque pode se utilizar dos benefícios da Lei reservados a deficientes físicos.

Em 2009, no Brasil, a súmula 377 do STJ alterou o conceito de cegueira legal para fins de cotas para deficientes visuais em concursos públicos ao incluir os portadores de visão monocular como deficientes visuais.

Leia também:

Lei de Cotas e Visão Monocular

 

Definição de classes de comprometimento visual e Classificação Internacional de Doenças(CID 10):

H54 Cegueira e visão subnormal ( Nota : Para a definição de classes de comprometimento visual, usar a Tabela a seguir)
H54.0 Cegueira, ambos os olhos – Classes de comprometimento visual 3, 4 e 5 em ambos os olhos
H54.1 Cegueira em um olho e visão subnormal em outro -Classes de comprometimento visual 3, 4 e 5 em um olho, com categorias 1 ou 2 no outro olho
H54.2 Visão subnormal de ambos os olhos – Classes de comprometimento visual 1 ou 2 em ambos os olhos
H54.3 Perda não qualificada da visão em ambos os olhos – Classes de comprometimento visual 9 em ambos os olhos
H54.4 Cegueira em um olho – Classes de comprometimento visual 3, 4 ou 5 em um olho [visão normal no outro olho]
H54.5 Visão subnormal em um olho – Classes de comprometimento da visão 1 ou 2 em um olho [visão normal do outro olho]

Nota:
O quadro abaixo apresenta a classificação da gravidade do comprometimento visual que foi recomendado pelo Grupo de Estudos sobre a Prevenção da Cegueira da OMS (WHO Technical Report Series nº 518, 1973)
O termo “visão subnormal” encontrado na categoria H54 compreende os graus 1 e 2 do quadro abaixo; o termo “cegueira” os graus 3, 4 e 5. Caso a extensão do campo visual venha a ser levada em consideração, os pacientes cujo campo visual se encontre entre 5° e 10° em torno do ponto central de fixação devem ser colocados no grau 3 e os pacientes com campo até 5° em torno do ponto central de fixação serão colocados na categoria 4, mesmo se a acuidade central não estiver comprometida.

Graus de comprometimento visual Acuidade visual com a melhor correção visual possível

Visão do melhor olho inferior a                    Visão do pior olho igual ou melhor que

 1                                                                               20/70 ou 0,30                                              20/200 ou 0,10

 2                                                                               20/200 ou 0,10                                            20/400 ou 0,05

 3                                                                               20/400  ou  0,05                                          20/1200 ou conta dedos a 1m

 4                                                                               20/1.000  ou  0,02                                       percepção de luz

 5                                                                   Ausência de percepção de luz

 

 

Referências:
Fonda, G. Management of Low Vision. Thieme-Stratton, New York, 1981, 248 p.
Portaria nº 3.128/2008 (Regulamenta ações de atenção à pessoa com deficiência visual)
WHO Technical Report Series nº 518, 1973

Sociedades médicas de especialidades e suas relações com a Indústria

Conflitos de interesses permeiam as relações entre médicos, sociedades médicas de especialidades, instituições de ensino e pesquisa e as indústrias farmacêutica e de equipamentos médicos.

O interesse pelo estudo dessas relações que envolvem conflitos de interesse aumentou recentemente. Observa-se crescimento do número de publicações sobre o tema a partir de 2000, com tendência à condenação deste relacionamento e recomendações no sentido de limitá-lo.

No Brasil, o código de ética médica de 2009 aborda a questão. Os artigos 20, 104, 109 e 116 determinam que é vedado ao médico participar de anúncios de empresas comerciais, qualquer que seja sua natureza; deixar de manter independência profissional e científica em relação a financiadores de pesquisa ou satisfazendo interesse comercial ou obtendo vantagens pessoais. O médico deve, também, declarar relações com indústrias que possam configurar conflito de interesse, ainda que potencial 5 .

A ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária publicou em 12/2008 resolução que dispõe sobre a propaganda, publicidade, informação e outras práticas cujo objetivo seja a divulgação ou promoção comercial de medicamentos. Esta resolução mostra-se sintonizada com as idéias sobre o assunto recentemente publicadas na literatura médica. O art. 7°-V proibe, na propaganda ou publicidade de medicamentos, incluir marcas nominativas, figurativas ou mistas de associações e/ou sociedades médicas, associações que representem os interesses dos consumidores ou dos profissionais de saúde e/ou selos de certificação de qualidade. O item VIII veda fazer propaganda ou publicidade de medicamentos e/ou empresas em qualquer parte do bloco de receituários médicos 1 .

A oftalmologia brasileira mantém-se relativamente alheia à influência da indústria no Conselho Brasileiro de Oftalmologia e nas diversas sociedades de áreas específicas da oftalmologia. A seguir apresenta-se dois exemplos.

O Conselho Brasileiro de Oftalmologia (CBO), órgão máximo da oftalmologia brasileira, mantém vínculos estreitos com a indústria de medicamentos, equipamentos e lentes, que financiam muitas de suas atividades. O CBO é uma sociedade civil sem fins lucrativos constituída em 1941. O CBO é o departamento de oftalmologia da Associação Médica Brasileira (AMB), e funciona como uma associação científica e cultural de médicos oftalmologistas que defende os interesses da oftalmologia, fiscaliza, concede títulos de especialista, promove congressos, etc. Edita os Arquivos Brasileiros de Oftalmologia, revista de elevado prestígio científico. Várias sociedades oftalmológicas são filiadas ao CBO, podendo-se citar a Sociedade Brasileira de Catarata e Implantes Intra-oculares, Sociedade Brasileira de Cirurgia Refrativa, Sociedade Brasileira de Glaucoma, Sociedade Brasileira de Retina e Vítreo, entre outra

Na página da internet do CBO, assim como em material distribuído aos oftalmologistas do Brasil, como nos Relatórios de Gestão, a cada biênio, calendários, etc, a logomarca do CBO aparece ao lado da logomarca dos principais financiadores que, carinhosamente, são chamados de patronos (patrono = defensor, protetor, que financia; na Roma antiga, pessoa livre a quem estavam vinculados escravos – Houaiss  8).

No  “Relatório de Gestão 2007-2009” do CBO,onde são relatadas as atividades do biênio como “programas de formação e educação continuada“, “congressos“, “comunicação“, “projeção internacional“, “interface com poderes públicos“, “interface com empresas e entidades6 , páginas inteiras  estão dedicadas à promoção de algumas indústrias farmacêuticas, fabricantes de equipamentos, lentes de óculos e lentes de contato. O avental com o emblema do CBO é apresentado com a incorporação das logomarcas destes “patronos” (Figura 1). O relatório não presenta nenhuma informação sobre quantias recebidas pelo CBO desses “patronos”, assim como informações sobre outras formas de patrocínio, jantares, passagens, diárias de hotéis, inscrições em congressos, brindes, etc, oferecidos a funcionários ou membros da administração do CBO.

cbo1 - sociedades médicas

Figura 1 : Destaque do avental do CBO apresentado nas páginas 10 e 47 do relatório de gestão 2007-2009. (turvação da logomarca dos patronos foi realizada por nós, na imagem).

Outro exemplo refere-se a atividades promovidas pela Sociedade Brasileira de Glaucoma . O 3º Consenso Brasileiro sobre Glaucoma Primário de Ângulo Aberto, realizado em 2009,  reuniu 69 relatores convidados e deu origem a uma publicação 20. Nesta publicação consta o patrocínio de determinado laboratório que produz colírios usados para tratamento do glaucoma e consta agradecimento a este laboratório,  que assegurou os recursos logísticos necessários para que fossem reunidos em São Paulo “glaumatólogos de todos os principais quadrantes do país”. Destaca-se o fato de que não são informados quaisquer conflitos de interesse seja por participantes, seja pela própria Sociedade Médica.

Juramento dos médicos e das indústrias

Médicos assumem o compromisso de agirem na defesa dos melhores interesses dos pacientes, assim como da sociedade como um todo. O exercício da medicina é essencialmente uma atividade social. As associações médicas de especialidades ou associações médicas em geral, devem ser construídas em fundamentos éticos adequados baseados nessas mesmas premissas 9,13 .

As indústrias farmacêutica e de equipamentos ou produtos ligados à atividade profissional do médico possuem o compromisso de maximizar o capital e gerar lucro para seus acionistas. As indústrias não estão obrigadas moralmente a agirem no maior interesse dos pacientes ou coletivamente no melhor interesse da sociedade 9 .

A existência de um conflito de interesses entre a atividade médica e as indústrias é ínerente aos seus diferentes objetivos.

Brindes, presentes, motivações

A indústria farmacêutica dedica esforço considerável para criar um ambiente de relacionamento desde o início, com os médicos jovens durante a residência médica. Presentes, brindes, jantares, inscrições em simpósios e congressos são recebidos pelos residentes como um reconhecimento pelo sacrifício em horas de estudo e trabalho. O propagandista se coloca como um “amigo” do residente disposto a ajudá-lo e a transmitir informações e trazer novidades. A indústria desenvolve um relacionamento estreito com os médicos que prescrevem seus produtos e o resultado deste trabalho é verificado em pesquisas de prescrição realizadas junto às farmácias 3 .

A disponibilidade de amostras-grátis é um forte indutor para médicos prescreverem e pacientes utilizarem medicamentos mais caros, mas não necessariamente mais eficazes 2.

As motivações individuais de médicos frente ao relacionamento com a indústria são bem conhecidas: 1) titulação, por convites e participações em cursos, congressos, grupos de consenso; 2) reconhecimento ou satisfação pessoal de ser considerado uma autoridade em uma área do conhecimento; 3) sensação de pertencer a um grupo seleto de profissionais prestigiados; 4) dinheiro ou outros benefícios. Do lado das indústrias, os bilhões de dólares investidos anualmente neste relacionamento apresentam um retorno que é monitorado e serve de motivação para manter e zelar pela sua perpetuação 12 . Em 2006 estima-se que entre 27,7 e 57,5 bilhões de dólares foram gastos com a promoção de medicamentos junto aos médicos 14 .

A declaração de possíveis conflitos de interesses por parte do médico, seja frente ao paciente, seja em trabalhos científicos, apresentações ou palestras, tem sido questionada quanto à sua eficácia. A possível ineficácia da declaração de conflito de interesses decorre de: 1) indivíduos diferem naquilo que consideram como fonte potencial de conflito de interesse; 2) As declarações de interesses conflitantes geralmente não são passíveis de verificação; 3) há uma falta de clareza relacionada ao objetivo final da declaração; 4) não há dados sistemáticos mostrando como os indivíduos processam as informações, sejam aqueles que declaram a existência de conflito de interesse ou os que recebem a informação; 5) as declarações de conflito podem ser usados para “higienizar” uma situação problemática, sugerindo que a declaração da existência de conflito soluciona a questão e o indivíduo pode agir como se nada existisse; 6) estudos de comportamento humano mostram que os motivos individuais geralmente são inconscientes e que o comportamento frequentemente desvia-se do que seria considerado racional 2,19 .

Apesar de médicos compreenderem o conceito de conflito de interesses, existe uma tendência ao desenvolvimento de mecanismos psicológicos de racionalização e reinterpretação dos dados, ou dissonância cognitiva, que limita a eficácia de recomendações ou códigos de conduta externos ou auto-impostos. Provavelmente apenas a proibição de interações entre médicos e propagandistas, assim como a eliminação de brindes e amostras-grátis possa ser eficaz para reduzir a influência da indústria sobre o receituário médico 3,4 .

Propostas para limitar a influência da indústria sobre o médico

Devido à dificuldade de se mensurar a interferência dos brindes e outros favores sobre o comportamento do médico 11, devido à sua finalidade precípua de influenciar o receituário do médico e devido a eficácia duvidosa da declaração de conflito de interesses, foram propostas as seguintes políticas a serem adotadas por sociedades médicas de qualquer natureza e centros médicos acadêmicos, com relação às interações com as indústrias que atuam na área da saúde 2,15,10 :

1 – Brindes, presentes, refeições, passagens, etc – banimento completo.

2 – Amostras de medicamentos – proibição total, passível de ser substituída por vouchers para pacientes de baixa renda.

3 – Elaboração de listas de medicamentos padronizados – nenhum médico que recebe brindes, financiamentos, mantém relacionamento com laboratórios pode participar de comissões que decidem listas de medicamentos padronizados de instituições.

4 – Educação médica continuada – indústrias não podem dar suporte financeiro direto a nenhum programa específico. As contribuições devem ser doadas à instituição que, por sua vez, direciona a programas aprovados por comissões internas.

5 – Fundos para viagens de médicos – As contribuições devem ser doadas à instituição que, por sua vez, decide como utilizá-los.

6 – Contratos de pesquisa ou consultoria – pagamentos para consultoria ou palestras devem ser feitos apenas quando existir um contrato específico entre a indústria e o médico ou pesquisador; contratos sem objetivo claramente identificável devem ser considerados como brindes. Palestrantes pagos ou financiados por laboratórios devem ser considerados como uma extensão do aparelho de marketing das indústrias.

7 – Associações de especialidades não devem fazer acordos ou negociações que envolvam o uso do nome da organização em seu marketing de bens ou serviços 13 .

8 – Nenhuma logomarca de indústrias deve aparecer em pastas, sacolas, canetas ou outros brindes, assim como em publicações distribuídas para membros da sociedade que comparecem a encontros científicos 15.

9 – Prêmios e bolsas de estudos não devem receber o nome do laboratório ou indústria patrocinadora 15.

10 – Adotar transparência das contas relacionadas a patrocínios, inclusive disponibilizá-las no website: compra de espaços em áreas de exposição de congressos, compra de espaço publicitário em revistas editadas pelas associações, doações de qualquer natureza, financiamentos, passagens, diárias de hotéis, jantares, programas de ensino, patrocínio de reuniões para estabelecimento de consensos, etc 13 .

A adoção destas medidas envolve um período de ajustes, mudanças no modo de operação e mesmo redução de recursos disponíveis para atividades de inquestionável valor. Acredita-se, entretanto, que trarão benefícios para os pacientes e para a sociedade com um todo.

Os critérios para estabelecimento de consensos e recomendações de “melhores práticas” necessita ser modificado. Existem evidências de que, em diversos casos, esses consensos não estão direcionados para os melhores interesses dos pacientes e sim para interesses daqueles que lucram com as práticas recomendadas, devido a influência de financiadores ou à proximidade de indústrias 2,17 .

Há que se cuidar para que recomendações ou normas de conduta que tenham por objetivo restringir a influência da indústria no receituário médico e nas atividades das sociedades médicas, não se prestem a ajudar a legitimar e mesmo criar uma proteção jurídica para a indústria, ao invés de cumprir o seu papel precípuo 14.

Opiniões dissidentes

Encontra-se na literatura pontos de vista dissidentes com relação às recomendações de fortes restrições aos contatos com a indústria apresentados acima.

Stell 17 critica as regras moralistas e draconianas propostas, particularmente no que se refere à proibição de acesso a campus universitários e hospitais de ensino, de propagandistas e conferencistas ligados a laboratórios 2. Chama a atenção para o fato de que a medicina é uma arte-que-utiliza-a-ciência e que as demonstrações de novos produtos desenvolvidos pela indústria promove familiaridade, aquisição de habilidades técnicas, bons resultados, benefício para os pacientes, lealdade a marcas. Competição, busca de prestígio, dedicação, brilhantismo, técnicas engenhosas com ganhos evidentes para todos, não necessariamente são dominados pelo dinheiro. Os médicos deveriam manter postura crítica com relação ao material de divulgação que recebem e demandar por material de boa qualidade. Formas de parcerias com a indústria farmacêutica que possam trazer mais benefícios do que malefícios devem ser buscadas 7,16 .

Conclusão

Associações médicas em geral, incluindo aquelas de especialidades, são entidades civis que não se encontram sob o poder fiscalizador direto dos CRMs ou do CFM. Entretanto estas associações devem agir em consonância com os princípios que regem a profissão médica. Neste sentido devem os nossos conselhos, assim como a ANVISA, se debruçar sobre os conflitos de interesses que permeiam as relações entre médicos e sociedades médicas com as indústrias farmacêutica e de equipamentos, impondo limites e orientando. Devem ser banidas práticas que colocam em dúvida a integridade da profissão ou a defesa dos interesses dos pacientes e da sociedade como um todo. Urge que tiremos o atraso de vários anos e que códigos de conduta, normas e regras rígidas de transparência sejam estendidos a instituições de ensino e pesquisa, hospitais, residências médicas e associações médicas de qualquer natureza, assim como aos grupos que promulgam consensos de “melhores práticas baseadas em evidências”.

Referências
1- ANVISA – Agência Nacional de Vigilância Sanitária Resolução – RDC n° 96 de 17 de dezembro de 2008 www.anvisa.gov.br
2- Brennan, T.A.; Rothman, D.J.; Blank, L.; Blumenthal, D.; Chimonas, S.C.; Cohen, J.J.; Goldman, J.; Kassirer, J.P.; Kimball, H.; Naughton, J.; Smelser, N. Health industry practices that create conflicts of interest. A policy proposal for academic medical centers. JAMA 2006; 295: 429-433
3- Brody, H. Pens and other pharmaceutical industry gifts Am. J. Bioethics 2003; 3: 58-60
4- Chimonas, S; Brennan, T.A.; Rothman, D.J. Physicians and drug representatives: exploring the dynamics of the relationship. Soc. Gen. Int. Medicine 2007; 22:184-190
5- Código de Ética Médica – Resolução CFM n° 1931/2009 (Publicada no D.O.U. de 24/12/2009, seção I, p. 90) – disponível em www.portalmedico.org.br
6- Conselho Brasileiro de Oftalmologia – Relatório de gestão 2007-2009 www.cbo.com.br
7- DeMaria, A. N. Your soul for a pen? J. Am. Coll. Card. 2007; 49:1220-1222
8- Dicionário Houaiss da lígua Portuguesa Edit. Objetiva, Rio de Jaeiro, 2001
9- Jampol, L.M.; Packer, S.; Mills, R.P.; Day, S.H.; Lichter, P.R. A perspective on comercial relationships between ophthalmology and industry. Arch. Ophthalmol 2009; 127:1194-1202
10- Kassirer, J.P. Professional societies and industry support. What is the quid pro quo? Perpespectives in Biology and Medicine 2007; 50:7-17
11- Katz, D.; Caplan, A.L.; Merz, J.F. All gifts large and small. Am. J. Bioethics 2003; 3: 39-46
12- Lichter, P.R. Debunking myths in physician-industry conflicts of interest. Am. J. Ophthalmol 2008; 146: 159-171
13- Pellegrino, E.D.; Relman, A.S. Professional medical associations. Ethical and practical guidelines. JAMA 1999; 282: 984-986
14- Podolsky, S.H.; Greene. J.A. A historical perspective of pharmaceutical promotion and physician education. JAMA 2008; 300: 831-833
15- Rothman, D.J.; McDonald, W.J.; Berkowitz, C.D.; Chimonas, S.C.; DeAngelis, C.D.; Hale, R.W.; Nissen, S.E.; Osborn, J.E.; Scully Jr., J.H.; Thomson, G.E.; Wofsy, D. Professional Medical Associations and their relationships with industry. A proposal for controlling conflict of interest. JAMA 2009; 301:1367-1372
16- Sade, R.M. Dangerous liasions? Industry relations with health professionals (introduction) Journal of law, medicine & ethics 2009; 37(3): 398-400
17- Stell, L.K. Drug reps off campus! Promoting professional purity by suppressing commercial speech. Journal of law, medicine & ethics 2009; 37(3): 431-443
18- Sniderman, A.D.; Furberg, C.D. Why guideline-making requires reform. JAMA 2009; 30:429-431
19- Weinfurt, K.P.; Friedman, J.Y.; Dinan, M.A.; Allsbrook, J.S.; Hall, M.A.; Dhillon, J. K.; Sugarman, J. Disclosing conflicts of interest in clinical research: Views of institucional review boards, conflict of interest committees, and investigators. Journal of law, medicine & ethics 2009; 37(3): 581-591
20 – Sociedade Brasileira de Glaucoma. 3º Consenso Brasileiro Glaucoma Primário de Ângulo Aberto (Editor : Augusto Paranhos Jr.) ; São Paulo; BestPoint, 2009

A importância dos olhos na linguagem

A importância dos olhos está presente nas palavras do nosso cotidiano.

A seguir uma lista de expressões e provérbios que evidenciam a importância da visão e a crença popular de poderes mágicos ou especiais relacionados aos olhos.

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Em terra de cego quem tem um olho é rei

O que os olhos não veem o coração não sente

Olho por olho, dente por dente

Os olhos são o espelho da alma

Pimenta nos olhos dos outros é refresco

Ter o olho maior do que a barriga /
Olhos maiores do que o estômago

Um olho no peixe e o outro no gato

A beleza está nos olhos de quem vê

Dormir com um olho aberto e outro fechado

Cego em meio a tiroteio

Cego em briga de foice

Ficar a ver navios

 

Custar os olhos da cara

Pagamento “à vista”

Pagamento “a perder de vista”

Em um piscar de olhos

De encher os olhos

Fechar os olhos para

Fazer vista grossa

Não pregar o olho

Olho da Rua

Olho da fechadura

Olho do Furacão

Olho de águia

Olho de lince

Olho de vidro

Olho da sogra

Olho mágico

 

Ponto de vista

Golpe de vista

Saltar aos olhos

Abrir os olhos de alguém

Ficar de olho vivo

Olheiro

Olho clínico

Olhar de peixe morto

Rabo de olho
[/symple_column][symple_column size=”one-half” position=”last” fade_in=”false”]

Olho de matar pinto

Mau olhado

Olho gordo

Lançar poeira nos olhos

Ver com bons olhos

Ver com maus olhos

Olhar torto

Olhar de soslaio

 

Amor à primeira vista

À primeira vista

São seus olhos

Pelos seus lindos olhos

A menina dos meus olhos

Só ter olhos para

Andar de olho em

Olho comprido para

Olhos nos olhos

 

Evidente

Sem sombra de dúvida

Claramente / É claro /
Minhas ideias clarearam

Testemunha ocular

Acreditar nos próprios olhos

Ter algo a ver / Logo se vê / Está se vendo

Veja o que diz

Olhe aqui

Vidente

Visionário

Olhar para o dia de amanhã

Visões do mundo/ Visão da vida / Visão do problema

Revisão

Pessoa iluminada

brilhante/ mente brilhante / pessoa brilhante

Mandar ver

A olhos vistos

A olho nu

Ao alcance dos olhos

[/symple_column]