Pouco se fala sobre o risco do uso excessivo de lágrimas artificiais. Os colírios lubrificantes podem ser comprados livremente, pois não há exigência de prescrição médica. Existem dezenas de colírios disponíveis nas prateleiras das farmácias. Oftalmologistas também prescrevem, com frequência, lágrimas artificiais para desconforto ocular, olho seco e mesmo na ausência de sintomas.
A lágrima natural do nosso olho é composta por três camadas: uma camada de mucina junto à córnea, uma camada aquosa e por fim uma fina camada oleosa. A camada de mucina funciona como uma esponja para reter a camada aquosa que contém proteinas que protegem o olho contra infecções: enzimas bactericidas e imunoglobulinas. A película oleosa evita a evaporação da lágrima e favorece a retenção do filme lacrimal, necessário para uma boa qualidade de visão e conforto ocular.
Os colírios lubrificantes atuam basicamente no componente aquoso. Entretanto, mais de 60% dos casos de olho seco decorrem de problemas na película oleosa, produzida por glândulas das pálpebras e liberada durante o piscamento.
Conheça alguns riscos do uso excessivo de lágrimas artificiais: 1) prejudica a película oleosa que evita a evaporação da lágrima; 2)retira componentes que protegem o olho contra infecções; 3) desenvolve “dependência” ao uso do lubrificante, que leva ao uso frequente do colírio; 4) pode mascarar outro problema ocular não diagnosticado; 5) o colírio lubrificante ao secar, adere e cria depósitos nos cílios; 6) turvação momentânea da visão ao usar o colírio; 7) Há relato de complicações graves relacionadas ao uso de lubrificantes, inclusive mortes e casos de perda da visão.
Veja também: o mistério dos colírios contaminados – – olho seco – – risco do uso excessivo de lágrimas artificiais
A primeira definição de olho seco foi publicada em 1995, em consenso sobre estudos clínicos patrocinados pela indústria: Olho seco é um distúrbio do filme lacrimal causada por deficiência lacrimal ou evaporação excessiva e está associada a desconforto ocular.
Em 2007, essa definição foi alterada para: Olho seco é uma doença multifatorial das lágrimas e da superfície ocular que resulta em sintomas e desconforto. (DEWS II – Dry eye workshop).
Em 2017, a definição foi alterada para: Olho seco é uma doença multifatorial da superfície ocular caracterizada pela perda da homeostasia do filme ocular, acompanhada por sintomas…”.
Anteriormente a 1995, o nome genérico “olho seco” não era usado para justificar algum desconforto relacionado a uma noite mal-dormida, excesso de trabalho, ar condicionado no carro ou no trabalho, clima seco, vento, etc. O paciente apresentava suas queixas e o oftalmologista investigava a presença de deficiência de produção de lágrima, higiene inadequada nas margens das pálpebras, presença de doenças sistêmicas ou oculares e apresentava orientação individualizada, sem classificar o paciente como portador da doença “olho seco”.
Em decorrência do marketing relacionado à nova “doença olho seco“, esse diagnóstico atualmente atinge até 50% dos pacientes segundo TFOS DEWS Epidemiology Report; 2017.
Em uma série de textos mostraremos que OLHO SECO é um dos melhores exemplos de medicalização da saúde, prescrição excessiva de colírios desnecessários, influência da indústria no receituário médico, riscos para a saúde pública e gastos desnecessários (“da boca do representante do laboratório para o receituário médico”).
Ao clicar nas expressões a seguir você será direcionado para textos curtos sobre temas relacionados.
Lágrima artificial é produto fronteira – – – Risco do uso excessivo de lágrimas artificiais – – -Lágrimas artificiais & Complicações – – –
O preço das lentes de óculos com filtro azul é mais elevado do que o preço de lentes sem esse filtro. A recomendação para os clientes baseia-se na informação de que o uso de óculos com essas lentes proporciona maior conforto visual no trabalho com computador e celulares, reduz o cansaço, melhora o sono e protege os olhos. Esses benefícios não foram confirmados em estudos científicos.
As lentes de óculos com filtro azul são produzidas por indústrias como Zeiss, Rodenstock, Hoya, Essilor, entre outras. As informações que o cliente recebe nas óticas encontram-se nos folhetos de divulgação e no site dessas empresas. A venda dessas lentes gera maior lucro para as indústrias e para as óticas, assim como a venda das lentes com tratamento anti-reflexo.
Não há evidências científicas de que lentes de óculos com filtro azul beneficiam os pacientes. As lentes com filtro azul NÃO reduzem a fadiga no uso de computador, NÃO melhoram a qualidade da visão, NÃO melhoram o sono, NÃO protegem o olho ou a retina, quando comparadas às lentes mais baratas, sem esse filtro. Veja também vidros com filtro azul e promoção da saúde.
Uma revisão na literatura médica sobre lentes de óculos com filtro azul foi publicada em novembro de 2023. As lentes de óculos com filtro azul não apresentam nenhum benefício quando comparadas a lentes comuns, sem filtro e sem anti-reflexo (Blue-light filtering spectacle lenses for visual performance, sleep, and macular health in adults. Singh et al. Cochrane Database of Systematic Reviews 2023, Issue 8. Art. no.: CD013244. DOI: 10.1002/14651858.CD013244.pub2).
Prevenção do Ceratocone apresenta os quatro níveis de prevenção do ceratocone: Prevenção primária, secundária, terciária e quaternária.
Prevenção primária é a ação tomada para remover causas e fatores de risco, antes do desenvolvimento da doença. A recomendação para crianças e adultos no sentido de evitarem coçar, apertar ou massagear os olhos é o método mais eficaz de prevenção primária do ceratocone.
Prevenção secundária é a ação realizada para detectar a doença em estágio inicial. A realização de exames oftalmológicos periódicos é o método mais eficaz para a prevenção secundária. Durante a consulta, o oftalmologista investiga a existência do hábito de esfregar os olhos. O exame da topografia da córnea identifica estágios iniciais do ceratocone.
Prevenção terciária é a ação implementada para reduzir os prejuízos funcionais consequentes do ceratocone. Na maioria das vezes consiste em prescrever óculos ou lentes de contato. A prevenção terciária corresponde à atuação tradicional do médico.
Prevenção quaternária é a detecção de indivíduos em risco de intervenções médicas diagnósticas ou terapêuticas, geralmente de alta complexidade e custo elevado, que poderiam ser evitadas. A prevenção quaternária tem por objetivo buscar alternativas de tratamento e aconselhamento eticamente aceitáveis para expor o portador da doença a menores riscos. Exemplos de procedimentos que poderiam ser evitados em portadores de ceratocone são: cross linking, colocação de anel corneano, adaptação de lentes de contato esclerais, cirurgia de catarata com implantação de lente intraocular estenopeica**.
Como pode ser feita a prevenção quaternária: O paciente deve demonstrar interesse em compreender os riscos e benefícios das intervenções indicadas pelo médico. Consulta de segunda opinião com outro médico especialista* constitui a maneira mais eficaz de se evitar procedimentos invasivos ou de alto custo, conhecer melhor sua doença e buscar tratamentos eficazes e com menores riscos.
** Cross linking e implante de anel corneano intra estromal estão classificados na categoria de procedimentos cirúrgicos e invasivos e estão incluídos na cobertura dos planos de saúde e do SUS. Adaptação de lente escleral e cirurgia de catarata com implante de lente intraocular estenopeica não estão cobertos por planos de saúde ou SUS e os custos são pagos pelo paciente. Os custos de lentes de contato não estão incluídas na cobertura de planos de saúde.
* Diferentes médicos, diante do mesmo paciente, frequentemente diferem quanto ao diagnóstico e/ou quanto ao tratamento indicado. Yehuda Waisberg, autor desse texto, é médico oftalmologista com vasta experiência no atendimento e adaptação de lentes de contato em pacientes com ceratocone. Ao aconselhar seus pacientes, adota postura conservadora, priorizando opções de tratamento pouco invasivos, de menor risco e menor custo para o paciente.
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Entre os exemplos de exploração da credulidade pública relacionados à visão, está o uso da cor azul através de vidros com filtro azul para promoção da saúde.
O tratamento foi proposto pelo General do exército americano James Pleasonton (1808-1894) que publicou em 1876 o livro “A influência dos raios azuis da luz solar e da cor azul do céu no desenvolvimento da vida animal e vegetal“. Segundo Pleasonton, a luz azul seria benéfica para a saúde do ser humano, animais e plantas, sendo capaz de fortalecer a constituição de pessoas, aumentar a longevidade e tornar os deficientes físicos mais saudáveis. Propôs galpões de cultivo com paredes e tetos com vidros azuis.
Em 1877, a revista Scientific American publicou uma série de três textos sob o título “The Blue Glass Deception“, nos quais demonstrou a ineficácia do tratamento proposto por Pleasonton.
E.D. Babbitt (1828-1905) publicou em 1878 o livro “Os princípios da luz e da cor: O poder de cura através da cor“. Diversos adeptos do poder de cura através de luzes ou lentes coloridas, levaram ao desenvolvimento de práticas ligadas à foto-retinologia, terapia por cores ou cromoterapia. No passado utilizou-se máquinas que dirigiam luzes coloridas pulsáteis em direção aos olhos e que promoveriam a cura de erros refracionais, problemas de coordenação motora e outros problemas de saúde. Nos Estados Unidos a venda de máquinas que podem irradiar feixes de luzes coloridas com propósito curativo foi proibida por lei por ser considerada prática de charlatanismo.
Diferentes práticas ligadas à cromoterapia continuaram a ser oferecidas ao longo do século XX e ainda hoje. Esta abordagem terapêutica existe há mais de 100 anos, mas sua eficácia nunca chegou a ser comprovada. Pertence ao grupo de tratamentos alternativos que não resistem ao escrutínio científico.
O peixe quatrolhos, também chamado Tralhoto, nome científico Anableps anableps, é uma curiosidade da fauna brasileira. É um pequeno peixe, de 20 cm e pode ser encontrado em águas salgadas e doces no norte e nordeste do Brasil, no delta do Rio Amazonas. Vive em águas calmas e caça insetos e pequenos crustáceos próximo à superfície.
Esses peixes possuem apenas dois olhos, mas cada olho é capaz de enxergar, simultaneamente, acima e abaixo da linha da água, permitindo que o peixe capture seu alimento no ar e na água. Essa particularidade ajuda, também, na proteção contra predadores que se aproximem pelo ar ou pela água.
Os olhos do peixe quatrolhos são divididos em dois sistemas ópticos, com duas aberturas pupilares, duas hemi-retinas e uma córnea dividida por um septo horizontal.
1)Simmich, J.; Temple, S.E.; Collin, S.P. A fish eye out of water: epthelial surface projections and aquatic corneas of the “four-eyed fish” Anableps anableps. Clinical and Experimental Optometry 2011, 95:140-145 (foto); 2)Schwab, IR; Ho, V.; Roth, A; Blankenship, TN; Fitzgerald, PG Evolutionary attempts at 4 eyes in vertebrates. Tr. Am. Ophth. Soc. 2001, 99: 145158; 3) Arruga, H O olho do quatrolhos. Barcelona, 1941 (Livro)
O pássaro que enxerga com os olhos fechados: o “olho mágico” do Urutau (Nyctibius griseus — “Grey Potoo”).
O urutau ou mãe-de-lua é uma ave de hábitos noturnos que vive, principalmente, na região sudoeste do Brasil. Durante o dia permanece com os olhos fechados durante a maior parte do tempo. Esta ave é mais ativa nas primeiras horas da noite; possui olhos grandes, posicionados posteriormente na face.
O urutau apresenta particularidade anatômica em suas pálpebras superiores que consiste em 2 ou 3 pregas, que fazem com que permaneçam duas pequenas aberturas mesmo quando as pálpebras estão totalmente fechadas. Além disso, estas aves podem abrir e fechar as pálpebras de cada olho separadamente.
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A observação de aves em cativeiro, assim como essas particularidades anatômicas, sugerem que estas aves conseguem enxergar quando estão com os olhos fechados (“olho mágico”).
Duas pregas na pálpebra
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O urutau utiliza-se da camuflagem durante o dia. repousando em troncos de árvores com cor semelhante à sua plumagem (homocromia). Na foto ao lado e na sequência de fotos apresentadas a seguir, pode-se observar as duas pregas na pálpebra superior da ave, que repousa durante o dia em um tronco de árvore (Fotos tiradas por Cristiane Abreu e cedidas por GB Borinski; Tartarugalzinho – Amapá).
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Borrero H; J.I. Notes on the structure of the upper eyelid of potoos (Nyctibius) The condor 1974; 76:210-211
Cestari, C; Guaraldo, A.C.; Gussoni, C.O.A. Nestling behavior and parental care of the common Potoo (Nyctibius griseus) in Southeastern Brazil The Wilson Journal of Ornithology 2011; 123(1): 102-106
As “bruxas” e o olho.
Muitos brasileiros já ouviram, quando crianças, a informação de que o pó das asas de algumas borboletas, mariposas ou “bruxas” pode cegar. Trata-se de uma crendice popular.
As borboletas são insetos com dois pares de asas, encontrados na natureza em diversos tamanhos e cores. Algumas borboletas têm cor acinzentada ou escura e podem ter uma aparência menos agradável do que as borboletas coloridas.
A beleza das borboletas coloridas desperta sensações agradáveis, ligadas à primavera, felicidade e alegria.
As borboletas de cor escura, particularmente as grandes, podem despertar repulsa ou medo. Existem superstições ligadas a estas borboletas, que às vezes são chamadas de “bruxas”.
No Brasil é bem difundida a crença de que o pó da asa destas borboletas pode prejudicar os olhos e mesmo causar cegueira.
Asas de borboletas ou mariposas são revestidas por um “pó” que contém micro escamas e pode irritar os olhos. Não existe fundamento científico para a crença popular de que pegar borboletas ou bruxas e passar a mão nos olhos pode causar cegueira.
Em 1985 publicamos o artigo “Crendices populares relativas ao olho: as borboletas e o olho” (Waisberg, Yehuda; Machado, Ângelo Barbosa Monteiro; Oliveira, André Aguiar – Revista Brasileira de Oftalmologia; 44(3): 73-81, 1985), no qual estudamos este assunto.
Peixes da família do linguado (flat Teleosteans; Flat-fish) são muito apreciados na culinária. Em inglês, utiliza-se palavras diferentes para peixes desta família utilizados na alimentação: halibut – alabote; plaice – solha; turbot – rodovalho; sole fish- linguado.
Esses peixes possuem o corpo oval e achatado, medem de 30 a 50 cm de comprimento e pesam de 2 a 3 Kg. Apresentam mimetismo, se defendem através de manchas em seu corpo que imitam os locais onde vivem.
Estes peixes apresentam um fenômeno curioso e único na natureza. Ao nascer, apresentam a forma usual do corpo da maioria dos peixes, “em torpedo”, com um olho de cada lado da cabeça. À medida que se tornam adultos, passam a viver no fundo do mar e ficam deitados sobre um dos lados, de tal forma que um dos olhos permaneceria direcionado para baixo.
Conforme crescem, tornam-se achatados e um dos olhos migra, de forma dextrógira ou levógira, similar às pessoas canhotas e destras. Nos levógiros, como o Linguado, ocorre migração do olho para o lado esquerdo da cabeça e nos dextrógiros, como o Rodovalho, ocorre migração para o lado direito da cabeça. Eventualmente, os olhos ficam posicionados ao lado um do outro. Os dois olhos, como o resto da cabeça, ficam assimétricos.
Completada a migração esses peixes adquirem uma ampla visão binocular para cima, enquanto permanecem deitados no fundo do oceano. Muitas vezes o corpo permanece oculto na areia e apenas os olhos permanecem exteriorizados.
Referências
– Duke-Elder, S. The Eye in evolution. System of Ophthalmology – Vol.I; Henruy Kimpton, London; 1958; pag. 328-329
– Friedman, M. The evolutionary origin of flatfish asymetry. Nature07109; Vol. 454/10 July 2008|doi:10.1038
– http://pt.wikipedia.org/wiki/Linguado
Enxaqueca é uma doença que se manifesta em episódios isolados, mais ou menos frequentes, e que se acompanha frequentemente de distúrbios visuais ilusórios temporários, seguidos de dores de cabeça (cefaleia). Em 3/4 dos portadores, a doença se manifesta antes dos 20 anos de idade. O diagnóstico se baseia, principalmente, no relato dos sintomas pelo paciente.
Uma das características mais dramáticas da enxaqueca são as alterações visuais, que ocorrem em aproximadamente 1/3 dos portadores da doença. Os distúrbios visuais variam entre os pacientes e mesmo entre os episódios de enxaqueca de cada paciente. Os sintomas visuais podem ocorrer isoladamente, sem dores de cabeça, mas geralmente precedem a dor de cabeça e podem ser seguidos de aumento da sensibilidade à luz, náusea e vômitos. Os sintomas sensoriais que indicam o início do episódio de enxaqueca recebem o nome de aura. Tipicamente, os pacientes observam figuras estreladas de luzes coloridas em um dos lados do campo visual, que gradualmente se expandem e se abrem, mantendo a aparência luminosa em zig-zag. O paciente não é capaz de enxergar na área do distúrbio visual, que recebe o nome de escotoma cintilante. Este sintoma aparece e evolui ao longo de alguns minutos e gradualmente desaparece ao longo de 10 a 20 minutos.
Muitas pessoas ficam assustadas quando apresentam as alterações visuais associadas à enxaqueca e buscam consulta oftalmológica com urgência. Na maioria das vezes, quando o paciente é atendido, as alterações visuais já desapareceram e o exame oftalmológico não evidencia nenhuma alteração. Os sintomas da enxaqueca estão relacionados às alterações passageiras na excitação do córtex cerebral, de causa mal conhecida.
Os primeiros desenhos da aura visual foram publicados pelo astrônomo britânico Hubert Airy, em 1857, que descreveu e desenhou suas experiências visuais durante seus episódios de enxaqueca e despertou o interesse da comunidade científica. Descrições bastante precisas já estavam presentes em textos da escola hipocrática: “Phoenix’s problem: he seemed to see flashes like lightning in his eyes, mostly the right. And when he had suffered that a short time, a terrible pain developed toward his right temple ….”.
Referência
Eadie, MJ Hubert Airy, comtemporary men of science and the migraine aura. J R Coll Physicians Edinb 2009; 39:263-7