O preço das lentes de óculos com filtro azul é mais elevado do que o preço de lentes sem esse filtro. A recomendação para os clientes baseia-se na informação de que o uso de óculos com essas lentes proporciona maior conforto visual no trabalho com computador e celulares, reduz o cansaço, melhora o sono e protege os olhos. Esses benefícios não foram confirmados em estudos científicos.
As lentes de óculos com filtro azul são produzidas por indústrias como Zeiss, Rodenstock, Hoya, Essilor, entre outras. As informações que o cliente recebe nas óticas encontram-se nos folhetos de divulgação e no site dessas empresas. A venda dessas lentes gera maior lucro para as indústrias e para as óticas, assim como a venda das lentes com tratamento anti-reflexo.
Não há evidências científicas de que lentes de óculos com filtro azul beneficiam os pacientes. As lentes com filtro azul NÃO reduzem a fadiga no uso de computador, NÃO melhoram a qualidade da visão, NÃO melhoram o sono, NÃO protegem o olho ou a retina, quando comparadas às lentes mais baratas, sem esse filtro. Veja também vidros com filtro azul e promoção da saúde.
Uma revisão na literatura médica sobre lentes de óculos com filtro azul foi publicada em novembro de 2023. As lentes de óculos com filtro azul não apresentam nenhum benefício quando comparadas a lentes comuns, sem filtro e sem anti-reflexo (Blue-light filtering spectacle lenses for visual performance, sleep, and macular health in adults. Singh et al. Cochrane Database of Systematic Reviews 2023, Issue 8. Art. no.: CD013244. DOI: 10.1002/14651858.CD013244.pub2).
É um teste realizado em consultório oftalmológico, quando um paciente apresenta uma redução da visão e o médico deseja fazer a distinção entre uma baixa de visão relacionada a um erro refracional, que pode ser corrigido entes de óculos ou lentes de contato, de alguma outra doença.
Utiliza-se um cartão ou oclusor com pequeno orifício de 0, 5 a 2 mm. O teste é realizado em cada olho separadamente. O paciente procura ler letras à distância através do orifício, sem que esteja usando óculos ou lentes de contato, enquanto o outro olho permanece ocluído. Se a visão através do buraco estenopeico melhora, isto indica que a visão pode ser melhorada com óculos ou lentes de contato, caso contrário provavelmente a baixa de visão não pode ser corrigida desta maneira.
Este teste frequentemente é utilizado por crianças, em suas brincadeiras.
Óculos Estenopeicos
São óculos com lentes negras, nas quais existem diversos buracos de 0,5 a 2 mm ou uma fenda estreita, que permitem melhorar a visão de longe e de perto, em substituição às lentes de óculos ou lentes de contato. A melhora da visão decorre da redução da difração da luz e aumento da profundidade de foco, quando se enxerga através de uma pequena abertura.
A ideia do uso de lentes estenopeicas ou óculos com lentes estenopeicas para auxiliar pacientes com astigmatismo irregular como ceratocone, teve seus princípios óticos explicados por Valdés em 1623. Foi empregada clinicamente pelo oftalmologista francês Serre em 1857 e Fras Dinders em 1864.
A grande desvantagem do orifício estenopeico é a redução da quantidade de luz que entra no olho. A redução da luminosidade e a redução do campo de visão são incômodos que comprometem o seu uso constante. Duke-Elder, em seu tratado de oftalmologia (1970), considera o uso de lentes estenopeicas para melhorar a visão de longe e de perto como um método obsoleto, de uso restrito.
Recentemente, a utilização das propriedades óticas do braço estenopeico ressurgiu na oftalmologia como uma das abordagens cirúrgicas para presbiopia e astigmatismo irregular (implante corneano estenopeico Kamra para presbiopia, implante de lente intraocular estenopeica e implante de lente intraocular estenopeica para ceratocone).
Recentemente, divulgou-se na mídia proposta de um oftalmologista sobre tratamento cirúrgico que supostamente restituiria a visão a portadores de ceratocone. Trata-se de procedimento cirúrgico invasivo para tratamento do ceratocone. Não há publicações científicas para avaliar a segurança e as indicações dessa cirurgia e os custos do procedimento são pagos pelo paciente. A cirurgia não é aprovada pela Agência Nacional de Saúde (ANS).
Não existem estudos científicos publicados que comprovem a segurança e eficácia da LIO estenopeica para ceratocone. Os resultados dessa cirurgia invasiva e de alto custo nunca foram comparados com as alternativas seguras e de baixo custo existentes.
O tratamento consiste na realização de extração e substituição do cristalino transparente, que corresponde a uma cirurgia de catarata em pacientes que não apresentam catarata. No ato cirúrgico são implantadas duas lentes intraoculares (LIO), uma sobre a outra. A primeira LIO é para substituir o cristalino e a segunda é uma lente negra com uma pequena aberta.
A penetração da luz e das imagens no olho ficam restritas à passagem por esta pequena abertura. A função da pupila deixa de atuar. Em condições normais, a pupila controla a quantidade de luz que penetra no olho. Em ambientes com luminosidade alta a pupila diminui de diâmetro e em ambientes de baixa luminosidade, a pupila aumenta de diâmetro. O pequeno orifício da lente negra implantada é denominado buraco estenopeico, que conduz à denominação de lente intraocular estenopeica (em inglês, pinhole intraocular lens). A imagem através de um orifício estenopeico é mais nítida para longe e para perto porque ocorre redução de aberrações óticas relacionados à irregularidade da córnea, característica do ceratocone.
Existem algumas aplicações do uso do orifício estenopeico na oftalmologia. Algumas informações sobre essas aplicações podem ser acessadas clicando nos termos seguintes: Teste da acuidade visual com buraco estenopeico -– óculos estenopeicos — implante intracorneano estenopeico KAMRA —Lente estenopeica de fixação iriana.
É fundamental que o paciente compreenda o caráter experimental e as características da cirurgia de implante de LIO estenopeica para ceratocone e conheça as alternativas de tratamento para o seu caso. Caso ocorram complicações, pode haver dificuldade em solucionar os problemas. O tema de prevenção do ceratocone e a necessidade de evitar procedimentos de maior risco é apresentada em Ceratocone: Prevenção.
Diferentes médicos, diante do mesmo paciente, frequentemente diferem quanto ao diagnóstico e/ou quanto ao tratamento indicado. Yehuda Waisberg, autor desse texto, é médico oftalmologista com vasta experiência no atendimento e adaptação de lentes de contato em pacientes com ceratocone. Ao aconselhar seus pacientes, adota postura conservadora, priorizando opções de tratamento pouco invasivos, de menor risco e menor custo para o paciente.
Marcar Consulta Virtual
“Never in previous history has medical quackery been such a booming business as now” —- “paradox: the concurrent rise in 20th-century America of modern medical science and of pseudo-medical nonsense”
James Harvey Young – The Medical Messiahs; 1967; 1975; 1992; Princeton University Press
A Rede Globo, apresentou reportagem e postou texto e vídeo em seu site G1, sobre tratamento “inovador” para o ceratocone. Trata-se do uso de lente intraocular (LIO) estenopeica para o tratamento do ceratocone.
É um exemplo de jornalismo de má qualidade A rede globo promoveu pseudociência e estimulou cirurgia experimental em seres humanos.
Na reportagem, a Rede Globo entrevistou pessoa residente em área rural de Minas Gerais que, emocionada, relatou ter se submetido à referida cirurgia e apresentou suas impressões sobre o tratamento. A Rede Globo deixou de informar o que é ceratocone, o que é possível fazer para evitar o seu aparecimento ou progressão, como evolui a doença na maioria dos portadores da doença, quais os tratamentos existentes e qual o sucesso que é possível se obter com esses tratamentos. A Rede globo optou por fazer divulgação sensacionalista de uma cirurgia sobre a qual não há estudos científicos publicados que permitam analisar indicações, taxas de sucesso e complicações.
O tratamento apresentado é experimental e envolve a realização de cirurgia de catarata em pacientes que não apresentam catarata. Durante a cirurgia, implanta-se duas lentes intraoculares, uma delas tradicionalmente utilizada na cirurgia da catarata e outra lente intraocular, proposta pelo médico que idealizou a cirurgia, lente preta com pequeno orifício central. Esta lente reduz a quantidade de luz que entra no olho e impede ou dificulta o exame de fundo de olho, o controle do glaucoma e o tratamento de doenças da retina como a retinopatia diabética.
A divulgação de pseudociência promovida por jornalistas, em programas de televisão ou outros meios de divulgação, decorre de ausência de políticas editoriais relacionadas à identificação de pseudociência. Observa-se também falta de treinamento ou despreparo de jornalistas ou diretores editoriais que analisam releases ou informações recebidas de contatos pessoais (Cortinãs-Robira e col, 2014; CRM-SP, 2009). Sampson (1996) destaca que frequentemente a técnica jornalística envolve a busca de um paciente satisfeito ou o autor de alguma proposta qualquer. Esta metodologia jornalística favorece tendências de divulgação de tratamentos novos, não testados, que acabam abandonados devido à sua ineficácia ou às suas complicações. Envolve frequentemente interesses financeiros dos fornecedores da “novidade”, a exploração da credulidade humana e a busca de soluções milagrosas de problemas. Na reportagem, a Rede Globo não informou que o médico entrevistado que realiza a cirurgia tem interesses financeiros relacionados à fabricação da lente que ele utiliza em seus pacientes.
Cortinãs-Rovira, S; Alonso-Marcos, F; Pont-Sorribes, C; Escribà-Sales, E. Science journalist’ perceptions and attitudes to pseudoscience in Spain. Public Understanding of Science, 1-16, 2014
CREMESP – Jornalismo na área de saúde: é preciso separar o joio do trigo antes de divulgar assuntos médicos. Revista do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo, ed. 46 – Jan/fev/março de 2009
Sampson, W. Antiscience trends in the rise of the “alternative medicine” movement. Ann NY Acad Sci 1996 ; 775: 188-97
O ceratocone ou deformação cônica da córnea é frequente.
Ceratocone
O ceratocone causa redução da visão devido ao desenvolvimento de miopia e astigmatismo elevados. Nos casos moderados e avançados da doença, não se consegue obter uma boa acuidade visual com óculos, sendo necessário o uso de lentes de contato rígidas para melhorar a visão. Em uma minoria dos casos, pode ser necessário o transplante de córnea.
Em textos antigos e mesmo em alguns recentes, o ceratocone é apresentado como doença rara que se manifesta em 1 em cada 25.000 pacientes ou mesmo em 1 em cada 250.000 pacientes (Gorska&Sevost’ianov, 1998). Diferentes estudos mostram grande variação da prevalência da doença. Entre outros fatores, estas diferenças decorrem do critério adotado para o diagnóstico do ceratocone.
Há algumas décadas, ficaram disponíveis equipamentos para análise da topografia da córnea que permitiram a identificação do ceratocone em estágios iniciais, muitas vezes antes de prejudicarem a visão ou mesmo em pacientes com miopia e astigmatismo baixos ou moderados e visão normal com óculos.
Estudos recentes na Índia, Iran e Israel mostram que a prevalência do ceratocone varia em torno de 2,3% (Índia e Israel) a 3,3% (Iran). Estes estudos mostram que o ceratocone é uma doença frequente (Gokhale, 2013; Millodot e col, 2001; Hashemi e col, 2013).
Em nosso consultório, temos observado ao longo dos anos que o ceratocone é bastante comum entre os pacientes que atendemos.
Um dos importantes fatores relacionados ao aparecimento e progressão do ceratocone é o hábito de coçar, esfregar e apertar os olhos (http://yw.med.br/cocar-os-olhos-e-prejudicial/).
Fomos pioneiros no Brasil, na identificação da associação do ceratocone com o hábito de apertar os olhos e publicamos dois artigos sobre o assunto em 1989 e 1990 ( Waisberg Y, Katina JH. Ceratocone associado à cegueira congênita e compressão digito-ocular. Arq Bras Oftalmol. 1989;52(1):28-30 e Waisberg Y, Guarino MA, Santos UR O hábito de coçar os olhos em pacientes com ceratocone. Rev. Bras. Oftalmol. 1990; 49(6):8-14).
Em uma série de textos discutiremos questões relacionadas ao ceratocone, como: causa e prevenção, uso de lentes de contato e óculos, cross-linking, anel intra-corneano, associação com outras doenças etc.
As superfícies anterior e posterior das lentes dos óculos, quando não submetidas a um tratamento especial, refletem luz e imagens de objetos que se encontram à frente do indivíduo. Estes reflexos podem dificultar a visualização dos olhos de quem está usando os óculos, reduzem a transmissão da luz através da lente e podem provocar discretas imagens-fantasmas, particularmente em míopes.
A tecnologia para tratamento antirreflexo ficou disponível na década de 1970. Consiste no revestimento das lentes por finas camadas antirreflexo, que reduz os reflexos das superfície anterior e posterior das lentes. Existem diversas tecnologias patenteadas, diferentes nomes comerciais e diferentes níveis de qualidade. Recentemente foram introduzidas lentes de óculos com filtro azul, que anunciam vantagens não comprovadas.
A aplicação de película antirreflexo reduz a refletividade da superfície da lente e aumenta a transmissão da luz.
Vantagens das lentes antirreflexo: a principal vantagem é a estética dos óculos, com boa visualização dos olhos por trás das lentes. Muitos pacientes preferem as lentes antirreflexo, quando comparadas às lentes que não possuem esse tratamento. Esta preferência pode estar relacionada à melhora na visão de contraste e maior transmissão de luz através da lente, apesar de que esses benefícios parecem ser pequenos.
Desvantagens das lentes antirreflexo: 1) Preço elevado; 2) menor durabilidade das lentes, pois a película antirreflexo pode se estragar sob ação de algumas substâncias químicas, calor ou pela ao limpar as lentes; 3) sujam com maior facilidade, pois possuem tendência à aderência de oleosidade dos dedos e poeira; 4) quando sujas podem dar a impressão de falta de cuidado de quem usa os óculos (esta desvantagem é menor com tratamentos antirreflexos mais caros); 5) estudos comparativos indicam que aprox. 30% dos pacientes não relatam preferência por essas lentes.
Contraindicações às lentes antirreflexo: 1) óculos de crianças, adultos ou idosos que possivelmente não irão cuidar adequadamente das lentes; 2) óculos para leitura, quando existir previsão de que o paciente não irá tomar os cuidados necessários com as lentes; 3) quando o paciente busca lentes com maior durabilidade ou menor preço.